23 de março de 2011

Por que torcemos?


Por Henrique Martins

Eu era palmeirense... E na minha família, salvo algumas exceções, só tem botafoguense ROXO! Eu era a ovelha verde da família em um ninho de sofredores alvinegros. A razão dessa rebeldia? Na verdade não era rebeldia alguma. Eu simplesmente adorava a Turma da Mônica e sempre fui fã do Cebolinha, que é “palmeilense”. Pronto! Eu havia encontrado meu ponto de identificação com o futebol e poderia participar ativamente do universo futebolístico, certo? Errado! Depois que eu cresci um pouco e deixei o Cebolinha entre os meus ídolos infantis esquecidos, não vi mais sentido em torcer para o Palmeiras. Afinal, cessada a causa se extingue o efeito. O problema é que eu não conseguia mais encontrar nenhum outro ponto de contato forte o bastante para me ligar de verdade ao esporte. Eu realmente tentei, só que minha “veia nerd” acabou assumindo o comando. Resultado: Hoje sou daqueles que só torcem para o Brasil na Copa (no meu caso eu torço mais para ganhar no bolão do que qualquer outra coisa).
Mas por que o brasileiro em geral, diferente de mim, é tão apaixonado por futebol? Por que a dinâmica dos times, a competição e as intrigas entre torcidas seduzem tanto as pessoas? Certa vez um amigo me disse que futebol é a “novela” dos homens. Mas cada vez mais as mulheres estão indo contra esse estigma e provando enorme devoção aos seus times. Ou seja, a adoração ao futebol ultrapassa até mesmo preconceitos sexistas. Está indo além do eterno embate entre machismo e feminismo, e demais “ismos”. Por outro lado, o futebol realmente se equipara a uma novela imensa e extensamente ramificada, abarrotada de personagens, mocinhos e vilões, recheada de feitos heróicos, lances e gols que beiram a glória e o lúdico. Nesses termos, ele se torna uma das mais importantes ferramentas sociais do cotidiano brasileiro.
Como um bom questionador do óbvio eu queria entender porque meu irmão ficava alucinado em partidas de seu time. Ora, é muito fácil soltar aquele clichê despretensioso: Uai! Futebol é paixão e paixão não se explica! Mas se eu aprendi alguma coisa nessa vida é que tudo tem uma explicação, inclusive (e principalmente) a paixão desenfreada pelo esporte. Uma paixão que já tem uma programação específica no cérebro humano. Às vezes basta um leve estímulo para ativar essa paixão, que geralmente se traduz na escolha de um “time do coração”.
 Somos moldados por gerações incontáveis para gostar de esportes e competição. Os jogos esportivos estão entranhados em nossa história desde as antigas civilizações egípcia e chinesa, e atingiu um apogeu na Grécia Antiga, de onde se ramificou para todas as culturas do globo através dos séculos. Em outras palavras, a excitação que o torcedor sente hoje em um estádio lotado quando seu time faz um gol sofrido é a mesma que um romano sentia no Coliseu no ano 200 d.C. quando um gladiador azarão conseguia cortar a garganta de um leão enorme, furioso e faminto (muitos torciam para o leão).

Torcida do Flamengo em 200 d.C.
Contudo, eu ainda não conseguia compreender plenamente a questão da escolha do “time do coração”. Em jogos internacionais eu até entendia, afinal, era o Brasil contra outra nação. Era uma questão de nacionalidade. Mas não entendia a disputa acirrada entre times nacionais. Qual a razão de se adotar uma camisa e não outra? De torcer, gritar, argumentar, e – em alguns casos lamentáveis – agredir e até matar pelo time escolhido? Depois de muito observar percebi que devia sempre haver um fator de identificação marcante para que o torcedor mantivesse sua camisa para sempre. O fator preponderante, mas não absoluto, era que a infância de muitos torcedores havia sido marcada por uma grande influência de figuras paternais na escolha do time – não só o pai, como tios, primos, ou até irmãos. Desde criança foram talhados a torcer para um certo time e levaram isso para o resto de suas vidas. Já outros seguiram contra a correnteza e escolheram outro time qualquer ou mesmo aquele clube notadamente rival ao time do núcleo familiar (ainda bem que eu era palmeirense e não flamenguista).
Mas um fator interessante é que a maioria dos torcedores “roxos” de hoje foram “criados” na infância. Ora, o futebol é um prato cheio para as crianças, porque elas sempre querem participar dos “assuntos de adulto”. Como o futebol é democrático e atinge todas as classes brasileiras, a criança se sente acolhida pelo grupo maior (geralmente sua própria família, ou um grupo de amigos). Em outras palavras, torcer para o time da família (ou para um rival) é uma forma da criança participar do mundo adulto. Na hora do gol ela vai gritar e vibrar junto com seu pai, mãe, irmão, avô, primo. É o momento em que a relação de poder desaparece e a criança se sente de igual para igual, de uma forma positiva, em relação aos seus patriarcas e/ou matriarcas.
Mas os tipos de torcedores são tão variados que é impossível listar a história de cada um. Tem a forte questão da localidade, ou seja, torcer para o time de onde se nasceu ou de outro local que se tenha afinidade. Existe a massa de alienados violentos. Tem aqueles que subitamente torcem para os que estão ganhando no momento. Outros não se influenciam pelas opiniões de ninguém e escolhem seu time pela história do clube. Tem também os que torcem por conveniência, seja por estar curtindo em uma mesa de bar com os amigos ou em uma reunião informal qualquer. Mas, em TODOS os casos, nota-se a necessidade humana de fazer parte de um grupo, de estar sob a égide de uma bandeira. E por que a ideia de fazer parte de um grupo, seja ele qual for, nos soa tão agradável e confortante?
Se amontoar em tribos! Foi isso o que nossos ancestrais fizeram para sobreviver às ameaças do mundo e permitiu que você estivesse aí hoje lendo esse blog. Eles perceberam que se vivessem em grupos de cooperação – em tribos – eles teriam mais chances de sobreviver do que se vivessem separados. As chances de ser comido por um tigre eram bem maiores se você saísse da aldeia sozinho. Ou seja, desde cedo o Homo Sapiens incorporou a ideia de grupo, de time, de torcer para que seu bando sobreviva às adversidades. Viver isolado funcionou muito bem para outros animais dominantes como o leão ou a águia, mas nós somos muito frágeis estruturalmente. Sendo assim, além de nos unirmos, tivemos que percorrer uma longa escala evolutiva para estarmos hoje no topo da cadeia alimentar.

Mexeu com um, mexeu com 300!
Foi então que percebi que, em um quadro geral, todos os esportes são filhos bonitos e educados da Guerra. Um resquício alegre de uma ação que – apesar de condenável atualmente – nos definiu desde o surgimento da espécie. Para o ser humano o importante não é só competir, mas também dividir, conquistar e vencer. Fazer Guerra é o que a humanidade fez, faz, e ainda fará por séculos. A importância real da Guerra se auto-explica por suas consequências a longo prazo. Pois, de uma forma ou de outra, foi ela que sempre deu os empurrões tecnológicos na humanidade. Convém, inclusive, abrir um pequeno parênteses sobre isso.
Desde que vivíamos em cavernas, sempre que há uma guerra iminente, os lados antagônicos produzem equipamentos bélicos em massa e quebram a cabeça para montar estratégias super elaboradas e planos de defesa eficientes. A disputa, a tensão e a dúvida de que o rival talvez possua uma carta melhor na manga aprimora o progresso de ambos os lados. Esse comportamento inclusive torna válido aquele conceito mercadológico de que a competição estimula a qualidade. Como exemplo próximo temos a corrida tecnológica durante a Guerra Fria que nos mostrou uma mudança mundial completa em poucas décadas.
O homem ama esportes, pois ele é ao mesmo tempo – a nível subconsciente – um velado apaixonado por guerras. A adrenalina dos campos de batalha reais marcou o imaginário da humanidade desde o princípio, de forma que toda sorte de esporte surgiu como uma extensão civilizada da Guerra. Sob esse sentido, jogos esportivos são uma forma mais segura de sentir aquela viciante adrenalina do soldado entrincheirado abaixo do fogo pesado do inimigo – lutando por seus companheiros, por seu país e sua própria vida. Quem busca guerras ou esportes busca, principalmente, a emoção da batalha.
Contudo, para que arriscar minha vida em um tiroteio real se posso ir ao paintball?

Aqui abaixo você encontra um forte exemplo de sentimento de equipe. Do tipo que leva um time inevitavelmente à vitória sob seus adversários.

7 comentários:

  1. Torcida do flamengo em 200 d.C.

    EOSAHOOHEOHHASOEHAE

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  2. Muito bom o post :D~.Realmente quando se esta competindo em algum esporte a pessoa se sente em uma guerra fazendo de tudo pra defender seu orgulho/time/país,e é isso que torna as competições tao interessantes :D~.

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  3. Nossa... O Conrado comentando?! Que surpresa.

    Quando eu era criança eu torcia para o Bota Fogo pq meu padrinho sempre me prometia que seu eu fosse torcedora ele ia me dar a camisa do time... até aprendi a cantar o Hino, mas ele não cumpriu a promessa e eu tbm não.
    Aí tive uma fase flamenguista! kkkkk
    E hoje mal torço pelo Brasil na copa, na última dormir em alguns jogos inclusive...(Culpa do Dunga)
    Mas tbm não sou nenhuma referência para esportes ou qualquer outra referência de "tribo" pq não tenho apego por nada disso, mas deve ser bom para quem é engajado, torcer, vencer, e aprender a lidar com as derrotas tbm, assim como ocorre na vida.

    Abraços

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  4. Consciência é uma desgraça mesmo!
    huahuahuahuahauhauhuaahuahu

    Não dá pra ter uma atitude muito sincera quando se enxerga essas coisas!

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  5. Pois é Paul, a consciência dos processos pode realmente tirar o encanto das coisas. É o mesmo princípio do medo de escuro - do desconhecido. Depois q conhecemos, o medo se torna infundado.
    Por essas e outras q procuro torcer apenas para minha conta bancária. XD

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  6. Cadê os anônimos polêmicos? Senti falta... kkkkk

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  7. Excelente texto! A análise entre Coliseu / Estádio ficou perfeita sendo que, infelizmente, uma geração de torcedores ainda consideram-se "gladiadores". O esporte (principalmente o futebol) é um laço quase universal entre as classes sociais mais distintas. Cabe ao torcedor aderir a prática da civilização e abraçar a causa da forma como se deve (promovendo alegria, oportunidades e exemplo para a sociedade).

    Saudações Alvinegras Corinthianas!

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