30 de abril de 2011

O Casamento Irreal


Por Henrique Martins

Acordo com a TV da sala alta. Da última vez que isso aconteceu um tsunami tinha detonado o Japão. Levanto-me para sondar o noticiário e me decepciono com a importância “real” da notícia (trocadilho proposital). A versão masculina da finada princesa Diana estava se casando com uma tal de Lady Kate (se você se lembrou do Zorra Total pode se envergonhar).
            Dois bilhões de desocupados telespectadores estavam assistindo ao “casamento do século”. Importante notar que o casamento do século passado foi o da Lady Di – que infelizmente terminou em traições e morte – mas isso não vem ao caso. A superexposição desse tipo de futilidade demonstra claramente a visão em cone da imprensa, na qual sempre existe um assunto-mor em pauta, independente do valor da notícia. Uma energia de trabalho incrível dispensada em milhares de artigos, matérias e notas sobre o véu da noiva, a maquiagem simples da noiva, a ausência de beijo cinematográfico dos noivos, David Beckham entre os convidados ou o nobre cocô do cavalo do soldado no trajeto até o Palácio de Buckingham (Será isso uma quebra de protocolo?).
Foto autoexplicativa.
O cortejo real é o carnaval da tradicional cultura britânica. Um culto soberbo à “imortalidade” da família real. Sua carruagem é um carro alegórico sem plumas e paetês, porém imerso em dispendiosa extravagância. Coberto de uma suposta glória que faz brilhar os olhos de mentes frágeis e inocentes.  Obviamente que a Inglaterra não dá ponto sem nó. Por baixo dos panos dourados eles estão faturando bilhões em turismo por conta do casamento real. Entra século e sai século e a historinha da plebéia que se casa com um príncipe continua sendo um símbolo revivido e recontado exaustivas vezes em todos os meios de comunicação (filmes, livros, seriados, novelas, noticiários) e com a mesma audiência do público. Ora, apesar do óbvio caráter sensacionalista da imprensa o verdadeiro sustentador desse tipo de frivolidade é o próprio público. A grande massa é leviana, gosta de assistir futilidades. Afinal, poucos se aprazem de ficar vendo tragédias, assassinatos, estupros e latrocínios o tempo todo na TV. O problema desse tipo de comportamento é que todos já se esqueceram do tufão nos Estados Unidos, da crise nuclear do Japão ou do maluco do Omar Kadafi.
Ou seja, de certa forma, não se pode culpar nem os britânicos, nem a imprensa, nem o público pelo culto à família real. Ambos são joguetes, marionetes de um comportamento humano típico, presente em todas as camadas da sociedade: Endeusamento. Alguns exemplos característicos: Rei Roberto Carlos, Rei Pelé, Rainha Xuxa, Rainha Hortência, Gretchen, a Rainha do rebolado, Adriano, o Imperador, Ronaldo Fenômeno, Maradona (esse é praticamente o presidente da Argentina). Isso sem contar os “deuses” e “deusas” do showbizz: Michael Jackson (literalmente o Rei do Pop), Elvis Presley, Frank Sinatra, Bob Marley, Madonna, Beyonce, Lady Gaga, Justin Bieber Biba. Claro que muitos desses possuem ou possuíam um talento indiscutível, mas mesmo isso não justifica o endeusamento de um ser humano que come, respira e usa vasos sanitários como qualquer um de nós.
Fã insano de Justin Biba corta o braço em homenagem ao ídolo. Okay... próximo!
O ser humano sempre precisou de ídolos para seguir. No início era o líder tribal, depois vieram os reis e imperadores, os grandes pensadores, os líderes religiosos, os políticos. Hoje os principais modelos são basicamente atores (e pseudo-atores), músicos (e pseudo-músicos), e toda sorte de gente que faz sucesso por qualquer baboseira online. Decerto que os valores sobre quais tipos de coisas merecem verdadeira admiração mudaram com o tempo. O advento da internet e a integração crescente dos meios de comunicação geram uma velocidade absurda às notícias. Ídolos surgem em um dia e caem no outro. Verdades tidas como absolutas ontem são completamente desmentidas hoje. No meio disso tudo se encontra uma massa oculta de xenófobos idiotizados, prontos para idolatrar o próximo “deus” e brigar com todos aqueles que não compartilham de seu fanatismo. E isso se aplica não só aos fãs alucinados de qualquer ídolo de barro, mas também e principalmente à religião e a ideais políticos.
Nesse panorama, o pecado capital da soberba continua sendo retro-alimentado pelas suas próprias vítimas. John Lennon disse que os Beatles eram mais populares que Jesus Cristo. Um moleque como Justin Bieber diz que é mais famoso que Deus. Fãs histéricas desmaiam em show do Luan Santana. Mais de 900 fanáticos religiosos, incluindo crianças, cometeram suicídio coletivo em Jonestown. Enfim, o problema não é só o endeusamento por parte dos fãs, o pior é o ídolo que esquece que é feito de carne, osso e tripa e acredita que é realmente um deus, que está acima do bem e do mal. Muitos pensaram que depois de Hitler a eugenia estava com seus dias contados, mas tem muita gente por aí (não necessariamente famosa) que realmente pensa que tem sangue azul.
A maior diferença entre esses grupos é que um deles possui armas.
Por outro lado, podemos realmente culpá-los? Será que teríamos a aparente discrição e equilíbrio do príncipe William vendo meio mundo aos seus pés? Ora, a riqueza também é uma grande prova para o orgulho e para a arrogância. Será que não seríamos armadilhas fáceis de todo tipo de prazeres mundanos? Será que  não enxergaríamos a humildade e a idoneidade como “coisas de pobre”? Quantos artistas hollywoodianos já foram para a reabilitação?
O que faz um rei são seus súditos. O que faz um deus são seus fiéis. Ou seja, ninguém possui “realeza” intrínseca. São as pessoas que lhes atribuem valor.

23 de março de 2011

Por que torcemos?


Por Henrique Martins

Eu era palmeirense... E na minha família, salvo algumas exceções, só tem botafoguense ROXO! Eu era a ovelha verde da família em um ninho de sofredores alvinegros. A razão dessa rebeldia? Na verdade não era rebeldia alguma. Eu simplesmente adorava a Turma da Mônica e sempre fui fã do Cebolinha, que é “palmeilense”. Pronto! Eu havia encontrado meu ponto de identificação com o futebol e poderia participar ativamente do universo futebolístico, certo? Errado! Depois que eu cresci um pouco e deixei o Cebolinha entre os meus ídolos infantis esquecidos, não vi mais sentido em torcer para o Palmeiras. Afinal, cessada a causa se extingue o efeito. O problema é que eu não conseguia mais encontrar nenhum outro ponto de contato forte o bastante para me ligar de verdade ao esporte. Eu realmente tentei, só que minha “veia nerd” acabou assumindo o comando. Resultado: Hoje sou daqueles que só torcem para o Brasil na Copa (no meu caso eu torço mais para ganhar no bolão do que qualquer outra coisa).
Mas por que o brasileiro em geral, diferente de mim, é tão apaixonado por futebol? Por que a dinâmica dos times, a competição e as intrigas entre torcidas seduzem tanto as pessoas? Certa vez um amigo me disse que futebol é a “novela” dos homens. Mas cada vez mais as mulheres estão indo contra esse estigma e provando enorme devoção aos seus times. Ou seja, a adoração ao futebol ultrapassa até mesmo preconceitos sexistas. Está indo além do eterno embate entre machismo e feminismo, e demais “ismos”. Por outro lado, o futebol realmente se equipara a uma novela imensa e extensamente ramificada, abarrotada de personagens, mocinhos e vilões, recheada de feitos heróicos, lances e gols que beiram a glória e o lúdico. Nesses termos, ele se torna uma das mais importantes ferramentas sociais do cotidiano brasileiro.
Como um bom questionador do óbvio eu queria entender porque meu irmão ficava alucinado em partidas de seu time. Ora, é muito fácil soltar aquele clichê despretensioso: Uai! Futebol é paixão e paixão não se explica! Mas se eu aprendi alguma coisa nessa vida é que tudo tem uma explicação, inclusive (e principalmente) a paixão desenfreada pelo esporte. Uma paixão que já tem uma programação específica no cérebro humano. Às vezes basta um leve estímulo para ativar essa paixão, que geralmente se traduz na escolha de um “time do coração”.
 Somos moldados por gerações incontáveis para gostar de esportes e competição. Os jogos esportivos estão entranhados em nossa história desde as antigas civilizações egípcia e chinesa, e atingiu um apogeu na Grécia Antiga, de onde se ramificou para todas as culturas do globo através dos séculos. Em outras palavras, a excitação que o torcedor sente hoje em um estádio lotado quando seu time faz um gol sofrido é a mesma que um romano sentia no Coliseu no ano 200 d.C. quando um gladiador azarão conseguia cortar a garganta de um leão enorme, furioso e faminto (muitos torciam para o leão).

Torcida do Flamengo em 200 d.C.
Contudo, eu ainda não conseguia compreender plenamente a questão da escolha do “time do coração”. Em jogos internacionais eu até entendia, afinal, era o Brasil contra outra nação. Era uma questão de nacionalidade. Mas não entendia a disputa acirrada entre times nacionais. Qual a razão de se adotar uma camisa e não outra? De torcer, gritar, argumentar, e – em alguns casos lamentáveis – agredir e até matar pelo time escolhido? Depois de muito observar percebi que devia sempre haver um fator de identificação marcante para que o torcedor mantivesse sua camisa para sempre. O fator preponderante, mas não absoluto, era que a infância de muitos torcedores havia sido marcada por uma grande influência de figuras paternais na escolha do time – não só o pai, como tios, primos, ou até irmãos. Desde criança foram talhados a torcer para um certo time e levaram isso para o resto de suas vidas. Já outros seguiram contra a correnteza e escolheram outro time qualquer ou mesmo aquele clube notadamente rival ao time do núcleo familiar (ainda bem que eu era palmeirense e não flamenguista).
Mas um fator interessante é que a maioria dos torcedores “roxos” de hoje foram “criados” na infância. Ora, o futebol é um prato cheio para as crianças, porque elas sempre querem participar dos “assuntos de adulto”. Como o futebol é democrático e atinge todas as classes brasileiras, a criança se sente acolhida pelo grupo maior (geralmente sua própria família, ou um grupo de amigos). Em outras palavras, torcer para o time da família (ou para um rival) é uma forma da criança participar do mundo adulto. Na hora do gol ela vai gritar e vibrar junto com seu pai, mãe, irmão, avô, primo. É o momento em que a relação de poder desaparece e a criança se sente de igual para igual, de uma forma positiva, em relação aos seus patriarcas e/ou matriarcas.
Mas os tipos de torcedores são tão variados que é impossível listar a história de cada um. Tem a forte questão da localidade, ou seja, torcer para o time de onde se nasceu ou de outro local que se tenha afinidade. Existe a massa de alienados violentos. Tem aqueles que subitamente torcem para os que estão ganhando no momento. Outros não se influenciam pelas opiniões de ninguém e escolhem seu time pela história do clube. Tem também os que torcem por conveniência, seja por estar curtindo em uma mesa de bar com os amigos ou em uma reunião informal qualquer. Mas, em TODOS os casos, nota-se a necessidade humana de fazer parte de um grupo, de estar sob a égide de uma bandeira. E por que a ideia de fazer parte de um grupo, seja ele qual for, nos soa tão agradável e confortante?
Se amontoar em tribos! Foi isso o que nossos ancestrais fizeram para sobreviver às ameaças do mundo e permitiu que você estivesse aí hoje lendo esse blog. Eles perceberam que se vivessem em grupos de cooperação – em tribos – eles teriam mais chances de sobreviver do que se vivessem separados. As chances de ser comido por um tigre eram bem maiores se você saísse da aldeia sozinho. Ou seja, desde cedo o Homo Sapiens incorporou a ideia de grupo, de time, de torcer para que seu bando sobreviva às adversidades. Viver isolado funcionou muito bem para outros animais dominantes como o leão ou a águia, mas nós somos muito frágeis estruturalmente. Sendo assim, além de nos unirmos, tivemos que percorrer uma longa escala evolutiva para estarmos hoje no topo da cadeia alimentar.

Mexeu com um, mexeu com 300!
Foi então que percebi que, em um quadro geral, todos os esportes são filhos bonitos e educados da Guerra. Um resquício alegre de uma ação que – apesar de condenável atualmente – nos definiu desde o surgimento da espécie. Para o ser humano o importante não é só competir, mas também dividir, conquistar e vencer. Fazer Guerra é o que a humanidade fez, faz, e ainda fará por séculos. A importância real da Guerra se auto-explica por suas consequências a longo prazo. Pois, de uma forma ou de outra, foi ela que sempre deu os empurrões tecnológicos na humanidade. Convém, inclusive, abrir um pequeno parênteses sobre isso.
Desde que vivíamos em cavernas, sempre que há uma guerra iminente, os lados antagônicos produzem equipamentos bélicos em massa e quebram a cabeça para montar estratégias super elaboradas e planos de defesa eficientes. A disputa, a tensão e a dúvida de que o rival talvez possua uma carta melhor na manga aprimora o progresso de ambos os lados. Esse comportamento inclusive torna válido aquele conceito mercadológico de que a competição estimula a qualidade. Como exemplo próximo temos a corrida tecnológica durante a Guerra Fria que nos mostrou uma mudança mundial completa em poucas décadas.
O homem ama esportes, pois ele é ao mesmo tempo – a nível subconsciente – um velado apaixonado por guerras. A adrenalina dos campos de batalha reais marcou o imaginário da humanidade desde o princípio, de forma que toda sorte de esporte surgiu como uma extensão civilizada da Guerra. Sob esse sentido, jogos esportivos são uma forma mais segura de sentir aquela viciante adrenalina do soldado entrincheirado abaixo do fogo pesado do inimigo – lutando por seus companheiros, por seu país e sua própria vida. Quem busca guerras ou esportes busca, principalmente, a emoção da batalha.
Contudo, para que arriscar minha vida em um tiroteio real se posso ir ao paintball?

Aqui abaixo você encontra um forte exemplo de sentimento de equipe. Do tipo que leva um time inevitavelmente à vitória sob seus adversários.

17 de março de 2011

O tamanho dos seus problemas


Por Henrique Martins

Todo mundo tem preocupações que parecem insolúveis. Problemas corriqueiros que nos aborrecem profundamente, tais como: contas a pagar, casa para zelar, filhos para cuidar, trabalhos a executar, faculdade para estudar, intrigas a evitar, discussões a vencer, blogs a escrever, etc. Mas muitos de nós desconhecemos a verdadeira importância desses problemas perante um quadro amplo e universal. Outros, como eu, procuram ignorar qualquer tipo de quadro geral que tire toda a importância real dos problemas humanos. Por isso, proponho uma viagem mental para muito, muito longe daqui. Se estiver disposto basta me acompanhar nos parágrafos abaixo.
Imagine o tamanho do seu quarto, da sua casa, da sua rua. Agora pense no tamanho do seu bairro, da sua cidade, do seu estado. Até aqui a maioria das pessoas consegue visualizar com facilidade, mas agora pense na imensidão do Brasil! A partir daqui as coisas se complicam, pois começamos a pensar em termos continentais – só as Américas ocupam uma face inteira do planeta – e a Eufrásia (Europa+África+Ásia) possui a maior extensão de terra do planeta.
            O planeta... A partir daqui os números começam a fazer pouco sentido para nós, mas conhecer alguns números nos faz entender o tamanho do drama: O diâmetro da Terra é de 39.830 km e seu movimento de rotação (em torno de si mesmo) é de 1.674 km/h (para se ter uma ideia da rapidez disso basta comparar com a velocidade do som que é de cerca de 1.200 km/h).
Conforme avançamos, as distâncias começam a ficar muito fora de nossa realidade. Se você acha longe a distância de quase 2.400 km de Brasília a Fortaleza, o que acha de percorrer 400.000 km para chegar à Lua? Ou os 150 MILHÕES de quilômetros até o nosso Sol? Mas é sacanagem pular para o tamanho do Sol antes de falar dos irmãos maiores da Terra – os gigantes gasosos do Sistema Solar.
Júpiter, Saturno, Netuno e Urano são enormes em comparação ao nosso planeta. Se Júpiter – o maior planeta do Sistema Solar – fosse do tamanho de uma bola de futebol, a Terra seria do tamanho de uma bolinha de gude. Mas as coisas ficam realmente tensas quando pensamos na pequenez do nosso planetinha em comparação ao imenso Sol. Se nossa estrela-mãe fosse do tamanho de uma bola de basquete, a Terra seria tão pequena quanto uma ervilha.

Família boa se mantém reunida!
Ufa! Se parássemos por aí já seria muito mais do que podemos conceber em nossas mentes encaixotadas, mas para a alegria (ou desespero) de muitos a escala parece continuar infinitamente. Para tentar entender a partir daqui precisamos entrar no reino absurdo da medida astronômica mais famosa – o ano-luz. A velocidade da luz é de 300.000 quilômetros por SEGUNDO. Ou seja, se um avião viajasse na velocidade da luz ele daria 7,4 voltas em torno da Terra em apenas um segundo. E em um ano a luz percorre cerca de 9,5 TRILHÕES de quilômetros. É um número de 13 dígitos que simplesmente não nos diz nada, apenas que não vale a pena usar medidas comuns como “Km” para definir distâncias astronômicas.
A estrela mais próxima do nosso Sol – Proxima Centauri – fica a 4 anos-luz de nós. Ou seja, sempre vemos essa estrela 4 anos no passado, pois a luz, apesar de ser a coisa mais rápida do Universo, não é instantânea. Para trazermos esse absurdo a nossa escala humana imaginemos que o Sol tenha a distância de um passo da Terra, nesse exemplo Proxima Centauri estaria a 90 km de distância. O problema é que as demais estrelas e corpos celestes ficam ainda mais longe e às vezes tão distantes que percebemos que na verdade a velocidade da luz é muito lenta para a escala ridiculamente colossal do Universo.
Para tornar as coisas um pouco mais interessantes imaginemos a maior estrela conhecida pelo homem, a VY Canis Majoris – distante a 5 mil anos-luz da Terra. Se o nosso Sol fosse do tamanho de uma bola de tênis, a Canis Majoris seria do tamanho de um campo de futebol. Em outras palavras, o Sol, nosso “astro-rei”, está entre as menores estrelas conhecidas. Sorte nossa! Afinal, se o Sol fosse maior e mais poderoso certamente não haveria vida orgânica nesse planeta.
Se nós realmente estamos sozinhos no Universo... então é um PUTA desperdício de espaço!
 Ok! Até agora vimos uma escala ascendente de tamanhos e distâncias cósmicas diametralmente opostas a tudo que conhecemos e vivenciamos no nosso dia-a-dia. Mas agora imaginemos que as estrelas e seus sistemas planetários são como cidades espalhadas em um grande território. Algumas são pequenas vilas – como o nosso Sistema Solar – outras são grandes metrópoles – como a Canis Majoris. Assim como no nosso mundo as cidades geralmente são separadas por grandes pedaços de “nada”. Só plantações, florestas e montanhas praticamente vazias. Da mesma forma ocorre no espaço. As estrelas são separadas por gigantescos vácuos, verdadeiros desertos de escuridão.
Mas, da mesma forma que no nosso mundo, a união das estrelas, planetas, cometas, buracos negros e demais corpos fazem parte de um conjunto. Um “país” chamado galáxia. Nós estamos na periferia da Via-Láctea – uma galáxia em espiral com pelo menos 200 bilhões de estrelas. De uma ponta a outra nossa galáxia mede cerca de 100.000 mil anos-luz. Em termos mais humanos, vamos supor que se nosso Sol tivesse o tamanho de uma moeda de 25 centavos, a Via-Láctea seria do tamanho dos Estados Unidos.
Agora sim as coisas começam a ficar realmente loucas, afinal, a Via-Láctea é uma galáxia de tamanho medíocre em comparação a diversas outras estruturas galácticas. Nossa galáxia vizinha mais próxima, a M31 (Galáxia de Andrômeda), distante “apenas” 2,9 milhões de anos-luz da Via-Láctea, possui pelo menos o dobro do tamanho da nossa galáxia. Mas isso não é nada comparado ao verdadeiro enxame de galáxias que formam a supergigante Abell 2029 – a maior galáxia já detectada pelo homem. Ela consiste em um aglomerado de milhares de galáxias com um diâmetro de 5,6 milhões de anos-luz, o que equivale a cerca de 60 vezes o tamanho da Via-Láctea.
Existem cerca de 100 bilhões de galáxias no nosso Universo observável, cada uma com uma média de 100 bilhões de estrelas. Resultado: um 10 seguido de 21 zeros de estrelas. Mas tudo indica que só conseguimos observar um recanto tímido do Universo, uma pequena parte para além do qual devem existir outros trilhões de estrelas, galáxias, aglomerados e superaglomerados galácticos.
Você está aqui! Em algum lugar...
 Agora pare tudo e experimente voltar abruptamente para o seu quarto e para suas preocupações. Talvez tudo agora lhe pareça estranho e exótico – como se você fosse um estrangeiro em seu próprio mundo, um alienígena. Ou talvez você só tenha se irritado com todo esse papo de astrônomo amador e sentido a frustração de que, por mais que fuja da realidade, os seus problemas “pequenos” e mundanos continuam apitando na sua cabeça e você tem que resolvê-los, nem que seja rolando no travesseiro a noite inteira.
Mas não sou eu quem vai lhe dizer que seus problemas são pequenos e que você se preocupa a toa com a vida. Nem a imensidão do Cosmos tem autoridade para tanto. Tudo é uma questão de escala. Para o Universo os seus problemas talvez não tenham nenhuma importância, mas para você, mero mortal, eles necessitam ser imbuídos de grande valor. Aos grandes, grandes preocupações, aos pequenos, pequenos problemas. É aquele mesmo princípio religioso de que Deus não dá pesos maiores do que seu ombro pode carregar. Ora, as estrelas estão aí para nos lembrarem de nossa pequenez e como convite à humildade, por outro lado conhecer a si mesmo é algo muito mais frutífero para a evolução do ser humano do que contar estrelas.
É... agora eu entendo a comodidade de pegar uma cerveja e sentar o traseiro no sofá para ver o Big Brother ou o futebolzinho de quarta-feira.

O vídeo abaixo é uma simulação viva do texto acima. Confiram!

15 de março de 2011

Por que as novelas ainda fazem sucesso?


Por Henrique Martins

Sinceramente não sei, mas posso supor. Talvez seja apenas para que o seu João e a dona Maria da esquina tenham algo sobre o que conversar no dia seguinte (se bem que o seu João provavelmente vai falar de futebol). Mas arrisco dizer que, como sempre, são as metas lucrativas de grandes grupos de comunicação, do governo e de cada bandido de colarinho branco que estão em jogo – e que permitem que o “Pão e Circo” continue e ganhe força (se eu falasse isso na época da ditadura já estaria fugindo do País sem nem levar a escova de dente).
Novela é uma ideia que deu certo (em especial no Brasil e demais países latino-americanos), nada mais lógico do que continuar produzindo-as, com a mesma fórmula de sucesso de décadas: mocinho bonitão, mocinha apaixonada, vilão que odeia o casal, coadjuvantes escrachados, e o blábláblá politicamente correto de dar nojo. De forma que a cada novela só mudam os atores (às vezes nem isso), as roupas (às vezes nem isso também) e a temática (o pior que algumas reutilizam até isso), mas a narrativa continua praticamente inalterada, com poucas mudanças sensíveis de uma para a outra. Mas, se o lucro é o objetivo final e “em cavalo que está ganhando não se mexe”, a mídia vai trabalhar dia e noite, não no “Pão”, e sim no “Circo”. (alguém aí gritou Zorra Total?)
Mas para entender como o formato atual de novela estende sua influência na sociedade é preciso voltar muito no tempo. Antes mesmo que Sócrates tenha torrado o saco dos atenienses pela Grécia e tomado seu suquinho de cicuta. É preciso entender o que são e para que servem os ARQUÉTIPOS (aquele assunto chato de intelectualóide de óculos fundo de garrafa). Os arquétipos são, basicamente, imagens primordiais do nosso subconsciente (como se isso por si só explicasse alguma coisa). Eles influenciam os indivíduos e suas relações interpessoais e estão presentes na psique de cada ser humano vivente desse mundo, em um suposto limbo nebuloso e imprevisível chamado Inconsciente Coletivo (Esquisito? Calma, vai piorar).
De acordo com os escritores de psicologia junguiana Calvin Hall e Vernon Nordby (melhor não falarmos de Carl Jung aqui senão a gente vira a noite), “a mente do homem é prefigurada pela evolução. Desta maneira o indivíduo está preso ao passado, não somente ao passado de sua infância, mas também, o que é mais importante, ao passado da espécie, e antes disso à longa cadeia da evolução orgânica”.
Olá! Eu sou Carl Jung e já estou morto há 50 anos.
 O inconsciente coletivo seria, então, a parte da psique que armazena os conteúdos inatos herdados pela humanidade. Estes conteúdos, por sua vez, são denominados arquétipos. Ou seja, arquétipos seriam, então, imagens primordiais, enraizadas na psique por meio de incontáveis gerações e que, em determinados momentos, são ativadas quando entram em contato com alguma vivência ou experiência. Com o passar dos séculos, alguns desmembramentos arquetípicos deram origem aos mais variados tipos de personagem: o príncipe em cima do cavalo, a mocinha indefesa, a bruxa malvada, o mestre feiticeiro, o bobo da corte, a virgem, a criança pura, a fera, e por aí vai.
 Sabe-se que roteiros de sucesso como O Senhor dos Anéis, Harry Potter e Matrix utilizam conceitos mitológicos e arquetípicos largamente usados em todas as culturas. Por exemplo, em Senhor dos Anéis é realçado vários aspectos admirados e universalmente aceitos, tais como: a jornada do pequeno Herói contra o Mal absoluto (a insignificância de Frodo VS a quase onipotência e onisciência de Sauron), a queda do Herói ante as tentações do poder (a sedução irresistível do Um Anel e a queda de Frodo ante seu poder maligno), e – depois de transformado pelo sofrimento – seu retorno à terra que deixou no passado a fim de cumprir seu destino heróico (o retorno de Frodo ao Condado).
A saga de Harry Potter trata do crescimento de uma espécie de Herói comum nas mais antigas narrativas gregas – aquele que não foi criado por seus pais verdadeiros. Em Harry Potter a ligação de Harry com Voldemort é íntima, pois – fora a magia, os feitiços, os artefatos e toda a temática que compõe a narrativa – existe o fato de que o vilão é o assassino dos pais do Herói órfão. E isso torna as coisas MUITO pessoais. O desenvolvimento desta jornada baseia-se no esforço do Herói em tornar-se forte o suficiente – tanto no aspecto físico e psicológico – para poder vencer o vilão e, em um nível simbólico, “encontrar” seus pais. Seja na forma de vingança contra o assassino ou pela libertação do ódio parasitário que o prende ao vilão.
Qualquer semelhança com Matrix
não é mera coincidência.
Matrix enfatiza a questão do “escolhido”, ou seja, aquele que está predestinado a salvar sua terra e a humanidade de algum mal (no caso, as Super Máquinas das Trevas from hell). A jornada deste Herói é cheia de sofrimento, pois ele sempre precisa sacrificar-se não só pelas pessoas que ama, mas pela humanidade inteira, cumprindo assim o destino que a imagem do “escolhido” evoca ou, em um sentido mais mitológico, a imagem do Messias plasmado em nosso inconsciente coletivo.
            Mas para entender realmente o sucesso das novelas temos que encontrar paralelos mais próximos do que grandes filmes. Seriados e novelas são exibidos periodicamente, mas em grande parte não possuem nenhum outro ponto em comum. Vejamos um seriado de grande sucesso como LOST. A primeira vista, para o telespectador mais casual, Lost trata apenas sobre pessoas perdidas em uma ilha. Mas, de acordo com um dos criadores da série, o roteirista Damon Lindelof, a série trata sobre pessoas metaforicamente perdidas em suas vidas, que pegam um avião e caem em uma ilha no meio do “nada”. Desta forma, elas se tornam fisicamente perdidas no mundo. A ironia disto é que elas só podem encontrar novamente seu lar depois que forem capazes de encontrarem a si mesmas. Em outras palavras, apenas quando descobrirem seus arquétipos dominantes e aprender a dominá-los, elas não se sentirão mais perdidas no caos de suas vidas.
Para compor este conceito, as personagens são obrigadas a viver em uma ilha misteriosa cheia de perigos e conspirações e, assim, aprender a confiar uns nos outros. O apelo à sobrevivência surge o tempo inteiro e a trama complexa e cheia de reviravoltas deixa os telespectadores tão perdidos quanto as personagens que compõem o cenário da série. Neste ambiente de medo e mistério as antigas fórmulas de roteiro cinematográfico que funcionaram por décadas caem por terra, os rótulos são descartados e não existe mais o conceito simplório de Herói, Vilão e Vítima. Todos, em algum momento, são obrigados a cumprir algum papel – algum arquétipo. A vencer seus medos e traumas do passado e, assim, atingir a redenção.
Mas novelas não se parecem nada com isso. Elas normalmente têm roteiros previsíveis, sem profundidade, personagens caricatos, clichês visuais, abusiva utilização de expressões da “moda”, além de ser uma fábrica de bordões. Então, porque novelas continuam a fazer sucesso? A questão é que a estrutura da novela brasileira encontrou um caminho rápido para acessar esse dispositivo mental de lembranças embutidas na própria programação do cérebro humano – os ESTEREÓTIPOS. Que são nada mais que um subproduto dos arquétipos. Uma forma pronta e sem profundidade.


Todo mundo sabe que é muito fácil estereotipar alguém com base em sua forma de falar, classe social, sexo, raça, idade, etc. É uma forma primitiva que o cérebro encontra para poder simplificar as coisas, afinal, ninguém consegue armazenar tanta informação de tanta gente. Nosso cérebro automaticamente sabe disso e procura te poupar do trabalho de conhecer a fundo cada pessoa que você conhece ou encontra na rua. Ele geralmente define pessoas novas com apenas uma palavra: Gorda! Feio! Gostosa! Arrogante! Vagabunda! Burro! Preguiçoso! Puta! Emo! – Só que na nossa sociedade cheia de julgamentos de valor esse processo mental tem outro nome: Preconceito.
Seria justo então dizer que as novelas estão intrinsecamente fundadas no preconceito? Seria arriscar demais, mas quem não afirmaria qualquer coisa para não ouvir novamente: “Cada mergulho é um flash!”, “Di catiguria!” ou “Né brinquedo não!”?
“Tô certo ou tô errado?”

13 de março de 2011

A complexa arte da empregabilidade


Por Henrique Martins

Ah, o desemprego! A sensação de impotência cada vez que abrimos os olhos pela manhã para procurar as primeiras vagas online. A frustração de reviver um estranho sentimento de demissão cada vez que somos rejeitados em uma seleção. A constante luta para ser (ou parecer) suficiente para a empresa que te chama para uma entrevista. O gosto metálico na boca quando recebemos aquele telefonema tão esperado e presenciamos a morte da própria esperança: “Gostamos muito de você, mas encontramos alguém com um perfil mais adequado à vaga. Mas não se preocupe, seu currículo continuará em nosso banco de dados para futuras vagas”. BULLSHIT! (Não vou nem falar das situações em que o famoso QI – Quem Indica – nos rouba uma vaga garantida senão vou começar a espumar de raiva).
Claro que essas circunstâncias não se aplicam simplesmente aos desempregados velhos de guerra, mas também a todas as pessoas que não estão satisfeitas com seus empregos e buscam alguma ocupação que tenha mais a ver com seus gostos e metas. Logo, um bom desempregado talvez seja aquele que é empreendedor de si mesmo, autônomo, que faz seu próprio emprego. Mas há uma convicção cega enraizada na sociedade brasileira de que se uma pessoa está desempregada obviamente ela não é empreendedora. É preguiçosa ou simplesmente não quer trabalhar. (Preciso repetir BULLSHIT?)
Vista seu melhor (ou único) terno – aquele mesmo que você usou na última festa de formatura – e prepare-se mentalmente para encontrar outros patetas engomados como você para duelarem em seleções Ultra-Super-Mega elaboradas, com dinâmicas realmente dinâmicas, testes psicológicos patéticos, redações, provas, entrevistas e perguntas sem sentido. Verdadeiras guerras de gladiadores em busca de sua pequena oportunidade e lugar ao sol. Não sei bem o que acontece nos bastidores dessas seleções, mas posso supor: certos psicólogos precisam mostrar trabalho de alguma forma. Logo, elaboram testes direcionados à eliminação não necessariamente dos menos competentes e sim dos mais tímidos. Afinal, a timidez é amplamente enxergada como um indício de fraqueza, pusilanimidade e derradeiro fracasso.
Não importa quantas especializações, mestrados e doutorados você tenha, a timidez sempre será uma péssima característica para quem busca emprego. Nessas HORRÍVEIS e improdutivas dinâmicas de grupo é quase certo que o tímido vai desaparecer diante da ousadia de alguns ferozes e arrogantes “companheiros” de seleção, isso quando não são rebaixados e tem suas fraquezas desnudadas pelos próprios concorrentes. Pobres tímidos! Têm pavor de parecerem arrogantes e quando pensam em falar – em se expor – gaguejam, tremem, falam alguma besteira passiva e a eliminação é certa. Afinal, quem monta um processo de seleção para escolher e contratar um funcionário introvertido? Resultado: Todo tímido, necessariamente, tem que ser um ator.

Você vai trabalhar junto com a Mimosa lá na fazenda!
             Conseguir um empreguinho de merda que seja, ser empreendedor de si mesmo, consiste basicamente em atuar, ou seja, atuar para se vender da melhor forma possível. Aquele que busca seu espaço no mercado de trabalho precisa aprender a jogar dentro das regras desse jogo. “Enrolar” os psicólogos e convencer de que é a melhor opção para a vaga é apenas a primeira etapa. Manter uma impecável postura profissional é o próximo passo para segurar este emprego na área privada até que se passe em um concurso público – o ideal candango da estabilidade profissional – que, assim como as seleções do setor privado, possuem regras próprias para se jogar.
Concurso está longe de ser uma disputa de inteligência. Grosso modo, maior parte das provas tem pouco a ver com inteligência. Tem muito mais a ver com sua perícia em driblar os famosos “peguinhas” da banca, e na sorte de cair muito do que você estudou (mesmo que você tenha estudado tudo sempre haverá um ou outro tópico que você vai dominar menos). Ou seja, de uma forma ou de outra o aspirante à vaga tem que se modular para entender as regras do jogo. E se você não entender como o jogo funciona não vai importar o quanto você estude e quantas provas você faça. Você continuará sendo um mero estudante desempregado cheio de conhecimento teórico inútil.
Em simples palavras, o que significa o concurso público para grande parte do público brasiliense? Destruição definitiva ou suspensão temporária dos sonhos fantasiosos da infância para concretização de parte das realizações materiais. Muitos colegas concursados me dizem o seguinte: Estou nesse trabalho por agora, mas almejo mesmo é ser médico/engenheiro/músico/escritor/astro de rock, etc. Muitos nunca almejaram estar onde estão, mas sabiamente seguram seus empregos e estudam para concursos melhores até que tenham condições para transformar seus hobbies em empregos de verdade (Definição de “emprego de verdade”? Aqueles que geram lucro, oras!). Mas fora isso, a verdade é que concurso público geralmente fecha duas portas: A porta da riqueza e a porta da pobreza. Você nunca mais será pobre na vida, mas também não será rico.
Desemprego! É uma merda quando seu emprego foi pelos ares.
Enfim, voltando ao papo de atuar, neste carnaval tive a oportunidade de assistir ao show de improviso do grupo Sete Belos (ótimo, por sinal) que me fez refletir sobre a questão de ganhar a vida fazendo o que se gosta. Não sei se os integrantes do grupo possuem outros empregos formais, carteira assinada e todas essas coisas, mas só a ideia de estar ali em cima de um palco, ganhando para sorrir e fazer os outros sorrirem soa muito motivador. Isso me faz pensar no conceito de “Bem Maior”, quando uma atividade não possui nenhum mal em sua essência e só causa o bem aos seus executores e envolvidos.
Ganhar a vida fazendo o que gosta pode ser bem exemplificado através daquele velho ditado (porém inabalavelmente verdadeiro): Encontre uma atividade que goste e não precisará trabalhar nunca mais.

Segue abaixo uma bela sacada de empreendedorismo. Confiram:

12 de março de 2011

Tsunami, Ideologia e Discriminação


Por Henrique Martins

Sempre que um terremoto ou tsunami destrói parte de um país eu ouço ou leio na internet a seguinte declaração: Tá vendo? Esse terremoto/tsunami é culpa do homem! Se cuidássemos mais do nosso planeta isso não aconteceria!
A verdade é que essas pessoas demonstram tanta certeza de que o ser humano tem potencial para destruir o planeta que chegam ao absurdo de dizer que um terremoto é causado pelo aquecimento global. Mas um tsunami só pode ser causado por 4 fatores: terremotos submarinos, deslizamentos de terra submarinos, erupções vulcânicas submarinas ou meteoritos. E NENHUM desses fatores pode ser causado ou evitado pela ação humana.
Percebe-se que muitas das pessoas que afirmam isso simplesmente se escoram no “achismo” e preferem dizer o que seria politicamente correto nesta situação: Que toda e qualquer catástrofe natural é culpa do ser humano. Outras se esforçam para seguir a qualquer custo a ideologia “Salve o planeta”, mas na ânsia por achar um culpado para a catástrofe acabam jogando a culpa no bandido errado! Em um fantasioso tribunal planetário o ser humano poderia se defender com propriedade: Sim! Eu joguei toneladas de dióxido de carbono na atmosfera, causei o degelo de icebergs continentais e enlouqueci o clima, mas não causei terremoto ou tsunami nenhum!
Contudo, como já dizia o finado comediante norte-americano George Carlin: “Nos achamos muito importantes e agora todos querem salvar alguma coisa. Salvar o planeta? Nós nem sabemos cuidar de nós mesmos!”. É preciso incorporar a consciência de que o planeta não é nosso, ele apenas nos permite estar aqui por um breve momento de sua longa existência.
Essa bolinha azul está por aí há pelo menos 4,5 bilhões de anos. O aquecimento global vai no máximo nos matar.
Voltando ao assunto – o problema desta alienada busca por um culpado quase sempre é o estopim que leva a pensamentos discriminatórios e/ou racistas como: É! Esse mundo está perdido! Tudo culpa dos ________ (insira no espaço qualquer espécie de minoria discriminada). Nesse panorama, cada ideologia encontra um culpado diferente, pois esse tipo de comportamento generalizador é comum não apenas entre os pseudo-ambientalistas, mas entre todo tipo de pessoa com ideologias ferrenhas – feministas que agem como homens, machistas que odeiam gays, vegetarianos (tá, esses talvez nem tanto), religiosos que dizem que ateus vão para o inferno, ateus que dizem que religiosos não irão a lugar algum, e todo indivíduo com um sistema ideológico absoluto que não se dispõe a mudanças de pensamento.
E este é o grande problema da famosa ideologia: ela pode ser facilmente deturpada e usada para interesses de minorias privilegiadas. Por causa do absolutismo de ideias (em outras palavras, a fé cega) que as guerras religiosas no Oriente-Médio continuam a matar inocentes aos milhares. Que a Inquisição ganhou tanto poder na Idade-Média. Que até hoje encontramos grupos afeitos ao ódio racial como neonazistas ou Ku Klux Klan.
Entretanto, tudo isso está muito longe de nós. Podemos encontrar paralelos menores em nossa própria realidade. Afinal, que jovem nunca sentiu pelo menos uma pontada de aversão às “modinhas coloridas”? Aos emos ou Justin Bieber? Essa antipatia ao diferente contém, em certo grau, o germe do ódio que sempre caracterizou a dinâmica problemática dos grupos sociais humanos – que nunca foge ao padrão de enxotar os diferentes a sua própria sorte.
Infelizmente, por muito tempo os Direitos Humanos serão apenas palavras bonitas, destinadas a forjar um verniz de justiça e igualdade à sociedade. Afinal, o apego extremo a uma ideologia é pai do preconceito, e consequentemente a causa do sentimento mesquinho de que tudo que é novo ou diferente é ruim. Decerto que minhas palavras não pretendem pregar o agnosticismo, mas acredito que a tolerância, independente da ideologia pessoal, é a palavra de ordem para um mundo melhor.
Parafraseando Cazuza: Ideologia! Será que eu quero mesmo uma para viver?

11 de março de 2011

Análise: Cisne Negro


Por Henrique Martins 

(ATENÇÃO! Este texto contém spoilers).

Cisne Negro, do diretor Darren Aronofsky, nos remete à estranheza daqueles filmes que a primeira vista não se propõem a nada. Por exemplo, não há uma mensagem explícita como em Matrix (Seu mundo não é real!) na qual todo o roteiro se desenrola em cima desse conceito apresentado e estabelecido. Nesse sentido, Cisne Negro aproxima-se de filmes como o recente Onde Vivem os Monstros ou Clube da Luta, nos quais as mensagens realmente importantes estão veladas e é preciso um certo esforço mental para compreendê-las.
A história de Nina Sayers (Natalie Portman), uma bailarina obcecada pela perfeição, nos traz toda a carga dramática de um bom suspense psicológico. Se ficasse apenas por aí o filme já renderia um razoável thriller cult, daqueles que não nos apegamos e esquecemos totalmente em questão de dias. Mas, além das óbvias referências dualistas do filme, (Bem/Mal, Yin/Yang, Branco/Escuro) Cisne Negro disserta brilhantemente sobre sociopatias e de como tendências perfeccionistas - levadas às últimas consequências - podem desvirtuar a moral domada e reprimida de uma simples bailarina.
Nina sonha em estar à altura do papel principal do balé O Lago dos Cisnes e – mesmo de forma não consciente – está disposta a QUALQUER COISA para atingir esse objetivo. Aí então entra o caráter dual e progressivamente paranóico do filme. Ela já possui toda a técnica e graça para interpretar o papel do Cisne Branco, mas está longe de demonstrar a ousadia e imponência do Cisne Negro.
Seu coreógrafo, Thomas Leroy (Vincent Cassel), sabe que ela é tacanha demais para convencer como Cisne Negro e a ajuda a buscar inspiração no “lado negro da Força” (sexo, inveja, sexo, ódio, sexo, ressentimento, sexo, mágoas). Para piorar sua situação (ou melhorar) aparece Lily (Mila Kunis), uma bailarina que é exatamente o oposto de Nina. Enquanto Nina é fria e insegura, Lily é acolhedora e segura de si. Enquanto Nina é perfeita em seus movimentos marcados e sem emoção, Lily não possui tanta técnica, mas consegue seduzir com sua extroversão e ousadia. Ora, a crescente ameaça de Lily ao seu papel, regado a uma boa dose de paranóia, era tudo o que a mente perturbada de Nina – afeita aos parâmetros de perfeição técnica – precisava para se tornar uma sociopata interna.

 

Em meio às alucinações e delírios da bailarina percebemos progressivamente a opressão da mãe, Erika (Barbara Hershey), uma ex-bailarina que não pôde continuar a profissão, pois teve que criar Nina e, por isso, joga toda essa carga emocional (e sua fama não realizada) em cima da filha. Logo compreendemos que a obsessão de Nina pela perfeição é apenas uma extensão dos sentimentos obscuros da mãe, de sua ânsia pelo sucesso que não pôde realizar devido ao nascimento da própria filha. Não fica explícito se ela culpa Nina por sua derrota, mas Nina certamente acredita nesta culpa e se sente oprimida pela superproteção materna (uma imagem que ilustra bem isso é a ausência de trancas nas portas de sua casa, um símbolo da falta de privacidade e consequentemente da excessiva proteção).
 Se fossemos traduzir a história em bases arquetípicas, a mãe certamente seria uma espécie de Carcereira da Inocência Perdida de Nina, buscando debilmente resgatar sua própria bailarina interior e projetando tudo isso de forma destrutiva no presente e futuro da filha. Thomas seria o Tutor Espiritual, aquele que chama a Heroína (Nina) para a jornada e a auxilia no caminho. Já Lily – ao contrário do que pensam muitos que viram o filme superficialmente – não é o “Darth Vader” da história. No final fica explícito que Nina projetou Lily como o próprio Mal, mas quem conheceu o Mal foi ela mesma. A imagem da Lily que ela projetava em seus delírios era sua própria Sombra, o verdadeiro Cisne Negro. Mas essa projeção era nada mais do que uma faceta temida e reprimida de sua própria personalidade. Entretanto, mesmo a revelia, ela sabia que precisava afundar neste sombrio recanto mental, caso contrário não poderia interpretar os dois Cisnes com maestria. Então, no final, a Heroína torna-se a própria Vilã. E é nesse ponto que o filme brilha!


O Cisne Branco dentro dela, cheio de sofrimento e pesar, conhece a liberdade incompreendida do Cisne Negro, e vice-versa. O conceito de Yin Yang diz que cada vez que uma das forças atinge seu nível máximo esta revela dentro de si um pequeno germe de seu oposto. Ou seja, dentro de cada um existe, pelo menos, um pouco do outro.
Nina precisou conhecer a essência libertadora do Mal, precisou decompor sua própria moral correta – porém fraca e covarde – para adquirir a força e o charme descompromissado do Cisne Negro. Em outras palavras, Nina é tão perfeccionista que buscou a perfeição até mesmo quando precisou ser imperfeita. Por fim Nina torna-se um legítimo Cisne Negro, perfeito em sua imperfeição.


Segue abaixo o trailer do filme: